sábado, 30 de julho de 2011

QUEM GANHA COM AS INDENIZAÇÔES ?

  • Aviadores não são "doidões" que vivem de emoções e surpresas;
  • Aviadores são estudiosos, e buscam perfeição no seu saber, até porque sabem perfeitament o preço trágico do desconhecer;
  • Aviadores, diferentemente de "pilotos do circo de F1", por exemplo, jamais aceitariam operar em situações extremas, limitrofes às capacidades das máquinas que operam;
  • Aviadores são inteligentes, e exigem de suas empresas condições de treinamento específico;
  • Aviadores não "levam avião nas costas", tirando mais performance por mágica competência inexplicável;
  • Aviadores sabem que os termos "comandante" e "co-piloto" referem-se somente a atividades administrativas, e que quando estão em um cockpit conduzindo um vôo "produtivo", são parceiros e trabalham em conjunto (denomina-se CRM), sem imiscuir administrativos (poder do comandante) com assuntos técnicos, que são partilhados. Enfim, copiloto não é aprendiz;
  • Aviadores erram, e sentem-se frustrados quando isso ocorre;
A celeuma na imprensa a respeito do acidente do vôo 447 da Air France, com a pública exposição dos dados do CVR - Cockpit Voice Recorder, provocando o corre-corre dos advogados querendo provar que "se o erro foi dos copilotos, a indenização será maior", mostra e evidencia o instinto mercenário de alguns.
  • Profissionais de imprensa demonstram querer maximizar o trágico e o polêmico, para vender mais sua midia;
  • Profissionais do Direito, declaram estar buscando "maximizar resultados" traduzidos por indenizações polpudas e evidentemente, seu prêmio em forma de sucumbência pelo "trabalho bem feito".
E a segurança de vôo ? 

Pagando indenizações milionárias, como terá a empresa recursos para melhorar o treinamento dos aviadores?


Empresas de aviação possuem cornucópias escondidas no fundo dos hangares, ou tem sua fonte de renda proveniente da venda de passagens ao menor preço possível ?

Quantos passageiros a Air France deixou de transportar, em decorrência deste acidente ?

Se essa empresa falir, como punição pelo acidente, ela será substituida por outra, com o mesmo "expertise" conseguido pela Air France, que está no mercado desde que incorporou a Latecoere (http://www.latecoere.com/) que criou a Aeropostale...

Sim, a L'Aeropostale de Mermoz e Saint Èxupery, que virou a Air France.



Acabar com uma empresa de aviação é muito rápido e fácil, como infelizmente fizeram com a VARIG, TRANSBRASIL, VASP e CRUZEIRO DO SUL e até a PANAIR do BRASIL, sem contar a PANAM e várias outras.

Mas o conhecimento agregado de aviadores, de pessoal de manutenção, de doutrina de operação, de conhecimento de rotas, de gerenciamento de crises...
Seriam as novas empresas tão preparadas, como se o conhecimento viesse através de uma injeção na veia ou da leitura de alguns livros e manuais ?

Basta substituir um grupo organizado, especializado em transporte aéreo, por capitalistas dispostos a ocupar seu lugar, recrutando gente "disponível" no mercado ?

A Aviação, e por conseqüência a SEGURANÇA de VÔO - desculpe, ANAC, Segurança Operacional - continua garantida com a inclusão de novos capitalistas para explorar esse filão de mercado ?

E o transporte terrestre, por exemplo ?

É tão seguro que os jornalistas não publicam seus acidentes com o devido destaque (pelo número de fatalidades totais, em relação à aviação).
Nem advogados aparecem nos holofotes declarando "a importância de punir através de indenizações", e na maioria das vezes, tudo fica por conta do seguro obrigatório, que mal dá para pagar os funerais - e "liberado" somente meses depois do defunto esfriar.

Pêsames, familiares de usuários - indignados e ultrajados, que querem ser consolados com indenizações milionárias.
Acho que este caminho é o equivalente ao de se cuspir para cima - de toda a sociedade.

Vingança não é justiça!

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quarta-feira, 27 de julho de 2011

PERCEPÇÃO DO RISCO PELO AVIADOR

Aviadores são geralmente pessoas otimistas.

Riscos operacionais são naturalmente considerados, analisados e registrados mentalmente em conjunto com o "check-list de resolução do problemas" respectivo, e assim segue a vida e o vôo.
Exceto se o risco analisado não puder ser solucionado pelo aviador.
Neste caso ele deixa seu estado natural, para começar a reclamar, pedindo uma solução, em tom de exigência.
Infraestrutura aeronáutica subdimensionada não pode ser resolvida pelo aviador.
- Decolar pesado sem precisar, por necessitar de muito combustível para chegar a uma alternativa mais distante que o destino é motivo de irritação;
- Durante o vôo, em condições meteorológicas desfavoráveis, começar a perder aeródromos de alternativa devido "lotação de pátio de estacionamento" não irá deixá-lo "zen";

Aviadores voando com seu estado mental perturbado por pressões externas continuadas (já decola assim), é fator de alerta para quem cuida de Segurança Operacional, porque "a priori" já inclui um FATOR HUMANO (stress) a ser considerado em todas as ocorrências aeronáuticas neste ambiente.

Uma defesa começa a ser diluída por fatores externos ao vôo, e um pouco além da maioria dos Gestores de Segurança Operacional, pois a solução só é possível com a colaboração e empenho dos GESTORES DA NAÇÃO BRASILEIRA.

Até lá, vamos voando.

A seguir, o desabafo de um aviador de empresa de linha regular, resumido.

 

INFRAESTRUTURA AERONÁUTICA PELA ÓTICA DE UM AVIADOR DE LINHA


este comentário foi recebido via e-mail, e tem circulado pela internet. Pelo texto, seu autor autoriza a divulgação, e resolví apresentá-lo aqui, porque relaciona-se diretamente com a Segurança Operacional.

Tomei a liberdade de enxugar o texto, eliminando alguns "desabafos mais enfáticos", privilegiando a concisão e o destaque dos fatos relacionados à segurança operacional.


Como recebí também uma observação sobre este texto, contestando seu início que cita o continente africano, vou apresentar a partir da parte consensual:

"... é mais ou menos assim que um aviador se sente voando no Brasil; você tem uma tecnologia de ponta dentro do seu avião e um sistema precário e ultrapassado a sua volta. 

 Vou explicar porquê!

Atrasos: 
Os atrasos no Brasil tem características incomuns comparado ao mundo afora; quando se tem nevoeiro... somente Guarulhos e Curitiba tem sistema mais preciso para pouso por instrumento, conhecido como " ILS categoria 2".  
Porto Alegre, Florianópolis e Confins não tem esse sistema, estes sempre fecham por causa de nevoeiro. Manaus que tem uma localização extremamente peculiar (alternativas distantes) também não tem.  

Se você passageiro está indo para Porto Alegre, fique sabendo que seu avião não pode alternar Florianópolis caso Porto Alegre esteja fechado. Florianópolis tem um pátio para cinco aviões apenas e recebe mais 150 vôos de fretamento além dos regulares no verão. Também não tem taxiway (acesso o início da pista de decolagem), obrigando as aeronaves a taxiarem pela pista, que fica menos tempo disponível para pousos e decolagens.

O problema de pátios lotados é recorrente em Guarulhos, Vitória e Confins. Galeão e Congonhas eventualmente ficam nesta situação.


Lembrem-se que aqui é o Brasil e não Europa ou EUA, no qual os aviões são sequenciados para pouso com separações de 4 km entre aeronaves, enquanto que no Brasil é 8 km entre aeronaves e no caso de Florianópolis chega a 20 km por aeronaves por falta de taxiway.

AEROVIAS (rotas aéreas)
 Você sabia que quando você sai do litoral brasileiro e vai pra São Paulo você voa em curva? É necessário passar por cima do Rio de Janeiro, poderia ser direto via Minas Gerais. Esse contorno do litoral gera em cada vôo pelo menos 1000 litros a mais de combustível consumido. 


Mesmo com todo equipamento disponível, os controladores não oferecem a opção dos vôos diretos.
Mas não coloco a culpa nos controladores. A culpa não é deles. O sistema brasileiro é que é arcaico e bem precário. O salário deles é baixo e cheio de "concurseiros" sem compromisso com o seu trabalho. Alguns são sérios e dedicados porém não tem as condições de trabalho dignas. Apenas um controlador cuida de várias regiões do País e todos sofrem muita pressão para no final das contas serem menos eficientes que os controladores americanos, europeus e asiáticos. Outro dia ouvi um controlador se despedindo no rádio por que tinha passado em um concurso melhor – isto é vergonhoso para um país que quer ser "primeiro mundo" - , mas desejei a ele sucesso e espero que ele esteja feliz no emprego bem remunerado que ele tem agora .Talvez ele não foi valorizado como deveria. 


Eu como piloto de linha aérea digo sem exagero, que voar no Brasil hoje estaríamos voando numa espécie de alerta amarelo. Outro acidente está bem próximo de acontecer. Ao decolar não significa que temos a certeza de pousar no destino e nem no aeroporto de alternativa. Outro dia cinco aeroportos estavam literalmente fechados por falta de pátio; Confins, Galeão, Vitoria, Guarulhos e Campinas. Você tem que decolar de Brasilia para São Paulo com combustível suficiente para alternar Salvador. 


Isso  eleva custos operacionais, que juntamente com a incidência de impostos elevados,  diminuem a competitividade das empresas de aviação brasileiras, obrigando a realização de parcerias com empresas estrangeiras, nem sempre favoráveis aos interesses do Brasil e dos brasileiros.
 
Apagões na aviação irão se repetir pelos próximos anos. 
Tanto a Copa do Mundo como as Olimpíadas acontecerão em época propícia para a formação de nevoeiro, o que poderá gerar efeitos cascata de atrasos e cancelamentos de vôos. 

Solução: primeiro de tudo é: Os políticos começarem a pensar como os governantes de países desenvolvidos pensam ou, como disse o Raul Seixas; A solução é alugar o Brasil. 

Nos EUA, Europa e Ásia seus governantes constroem um aeroporto para atender uma demanda que só terá daqui 20 ou 30 anos e com pátio suficiente para estacionar mais de 100 aviões de grande porte juntos.  

Já é um absurdo os aeroportos brasileiros não terem metrôs. Os estrangeiros quando chegam aqui e não veem metrôs nos aeroportos, acham que é uma piada até entenderem que não existe mesmo. Em qualquer aeroporto no estrangeiro tem metrô. 

Que país é esse? O Brasileiro se compara muito aos EUA, porém o povo americano sabe exigir de seus governantes, por isso o governo não espera ser pressionado pra poder começar a fazer algo. " O povo Brasileiro sabe só reclamar, só não sabe reclamar para a pessoa certa, ou orgão "competente". Reclama pro vizinho e para o amigo, mas quase ninguém entra no site do Senado ou da Câmara dos deputados pra enviar e-mail para o seu político ou pelo menos saberem o que eles estão fazendo ".

É muito fácil ir ao Estados Unidos passear, fazer compras e voltar falando que lá é o máximo e aqui é o fim do mundo. De fato são décadas de diferença, porém lá o povo é mais consciente com o que seus políticos estão fazendo com o dinheiro público e a burocracia do funcionalismo público deles praticamente inexiste se comparado ao nosso. 



Boa sorte a todos nos próximos vôos!

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Perigo no ar: RAIOS !

Morrer por ter sido atingido por um raio !
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- Raro, não ?
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- Pois é, ocorreu mais vezes no Brasil, no ano passado (2010) do que mortes por acidentes aeronáuticos.
Fonte: CENIPA 
- Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos -


 Já os raios...

 http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/932810-raios-mataram-89-pessoas-no-pais-em-2010.shtml

Raios mataram 89 pessoas no país em 2010 

20/06/2011 - 21h45  


No ano passado, 89 pessoas morreram após serem atingidas por raios no Brasil, de acordo com o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). O número é menor que a média registrada entre 2000 e 2009, de 132 vítimas por ano.
Não quero difundir pânico generalizado quanto aos raios, nem querer convencer todo mundo que o medo de voar é apenas um fator psicológico não fundamentado em dados concretos, racionais.

Caso a estatística aqui mostrada fosse referente a acidentes fatais com carros, motocicletas e ônibus, a comparação ficaria mais gritante ainda. Nem por isso pessoas se despedem dos entes queridos ao antrar em um carro, como se (e infelizmente é) a jornada fosse cercada de grandes riscos.

Quero aqui prestar meu reconhecimento ao CENIPA - pelas décadas de trabalho sério realizado com a Prevenção de Acidentes Aeronáuticos, e também meu voto de confiança à ANAC, que está iniciando seus trabalhos no sentido de dar continuidade (espero que não queira fazer nenhuma "destruição construtiva") a este nobre trabalho.
E a todos que participam da aviação de alguma forma, em atividades profissionais ou amadoras, o alerta que o trabalho de prevenção de acidentes aeronáuticos é árduo, interminável, de baixíssima visibilidade externa e terrívelmente frustrante quando uma ocorrência surge para demonstrar que todo o trabalho precisa incluir mais um enfoque.

Voe com Segurança - Fly Safe !
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segunda-feira, 20 de junho de 2011

Utilidade do MGSO (exemplo)


Saiu na imprensa hoje, no site "Último Segundo" - http://ultimosegundo.ig.com.br/

“À beira da Guanabara, Aeroporto Santos Dumont não tem botes para salvamento aquático" (clique aqui para ler a notícia completa)

(foto do site da IG - link)

"Anac aponta falta de equipamentos e bombeiros temem tragédia. Lanchas da Infraero não funcionam e socorro é feito com embarcação emprestada.”

 

 

 

"O laudo de vistoria da Anac aponta uma série de irregularidades e a falta de equipamentos adequados na unidade responsável pelo combate imediato de incêndios e acidentes no aeroporto Santos Dumont, o segundo maior do Rio. O aeroporto é o mais usado da ponte-aérea Rio-São Paulo e, na última sexta-feira, teve 110 voos domésticos – ficando só atrás de Congonhas (SP), Guarulhos (SP) e Brasília (DF).
De acordo com visita técnica da Anac, ocorrida entre 28/2 e 1/3 de 2011, foi verificada “ausência de botes e boias para salvamento aquático”. Quase quatro meses após o laudo, a unidade continua sem botes e boias.
No documento, a Anac afirma que, como “medida urgente, o operador aeroportuário deverá estabelecer um plano de contingência relacionando os recursos existente planificados, tempos-resposta, capacidade de salvamento/resgate, procedimentos e responsabilidades de cada ente participante”.

Entendo que o "vazamento" do conteúdo da Vistoria (seria Auditoria ?) de Segurança Operacional feita pela ANAC é uma grave falha procedimental, e não contribui para a facilitação, ou "convencimento" dos executivos das empresas a permitirem a realização de Vistorias de Segurança Operacional em suas empresas.

Dentro da ótica do SIPAER (CENIPA), isto é quebra do código de ética e passível de punições, para quem fez a indevida divulgação. A ANAC também recomenda o sigilo, e por isso espera-se que providências sejam tomadas quanto a este aspecto.

Mas procurando tirar coisas boas de fatos desagradáveis, aproveito a publicação da notícia para informar:
  1. Ao público em geral: Os Provedores de Serviços de Aviação Civil (aeroportos, empresas e escolas) tem ou estão implantando o SGSO (sistema de Gerenciamento da Segurança Operacional), através de um Manual (MGSO), e nele são previstas Vistorias e Auditorias de Segurança Operacional, periódicas e préviamente agendadas - e também não agendadas pela ANAC, justamente para identificar  falhas antes que possam contribuir para um acidente ou agravamento das consequencias de um incidente/acidente;
  2. Para os Executivos Principais dos Provedores de Serviços de Aviação Civil: Os relatórios de Vistoria de Segurança Operacional e de Auditorias de Segurança Operacional, continuarão sendo tratados de forma sigilosa por este GSO que aqui escreve, e recomenda este procedimento para todos;
Voe Seguro ! - Fly Safe !

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Planando à noite em um Boeing 747, sobre o Oceano Índico


Era um vôo rotineiro e tranqüilo, e o Jumbo 747-236B, matrícula G-BDXH (City of Edinburgh) da British Airways fazia o vôo 9 (BA flight 9), que havia se iniciado em Londres. Decolara da escala em Kuala Lampur cinco horas atras, e sobrevoara havia pouco a capital da Indonésia, Jacarta a 37 mil pés, com destino à Pert, na Austrália. Depois prosseguiria para Auckland  na Nova Zelândia.  

G-BDXH (City of Edinburgh)
Haviam 263 pessoas a bordo.

A data era 24 de junho de 1982, e se passavam pouco mais de 30 minutos das 20 horas (local), ou 13h UTC.
Seu comandante, Eric Moody e sua tripulação não sabiam (a informação não estava disponível), que o vulcão Galunggung, situado a 110 milhas a sudoeste de Jacarta havia entrado em erupção seis horas atrás, lançando enorme quantidade de gases e cinzas no céu que eles iriam cruzar em sua rota.

Nada aparecia no radar meteorológico do avião, e o comandante Eric saiu para esticar as pernas, quando notou um cheiro parecido com fumaça de fiação elétrica, o que o fez retornar imediatamente para o cockpit.
Ao entrar no cockpit e ocupar seu assento, era visível o “fogo de Santelmo” em todo o parabrisas. Enquanto questionava a tripulação a respeito do cheiro  observava estranhas minúsculas partículas brilhantes contornando o nariz do avião.
O motor #4 apagou !
Foram iniciados os procedimentos de falha de motor, enquanto também ocorria o flame-out do motor #2, seguido poucos segundos após pelo #3 e pelo #1. O Mecânico de Vôo disse o óbvio:
- Desculpem, mas perdemos todos eles ! Era 13h42’ UTC (20h42’ local).
O Comandante estabeleceu o drift down (descida forçada) e tomou a proa inversa para Jacarta; O Primeiro Oficial declarou pelo rádio a emergência enquanto o Mecânico de Vôo tentava reacender pelo menos um motor (flight start).
O rádio transmitiu com muita estática, e a mensagem de emergência não foi entendida pelo controle de tráfego aéreo de Jacarta, sendo então  retransmitida incompleta (pela dificuldade de compreensão) por outro avião, que entendeu que somente o motor #4 do G-BDXH havia se perdido, e não seus 4 motores.

Tinham eles 23 minutos para pousar (no Oceano Índico), caso nenhum motor voltasse a funcionar.
A aeronave despressurizou pela falta de ar vindo dos motores agora inoperantes,  as máscaras para os passageiros caíram como previsto, e a tripulação também usou as suas. Não houve pânico entre os passageiros, quando o Cmte Eric dirigiu-se aos passageiros pelo interfone com esta mensagem:
"Ladies and gentlemen, this is your captain speaking. We have a small problem. All four engines have stopped. We are doing our damnedest to get them under control. I trust you are not in too much distress."
"Senhoras e senhores, quem fala é o comandante. Temos um pequeno problema. Todos os nossos 4 motores pararam, Estamos fazendo o máximo para controlar esta situação. Acredito que o perigo não é muito grande para vocês."

Os pitots (sim, os pitots !) estavam parcialmente entupidos, e havia uma diferença de 50 kt nos velocímetros. O Comandante optou por acreditar estar voando na velocidade média entre eles, por não ter como saber qual era o mais acurado, e usou a razão de descida como parâmetro de controle.
Ainda descendo, e próximo de 12 mil pés, o motor #4 foi recuperado, mas não teria potência suficiente para manter a altitude mínima de 10500 pés necessária para ultrapassar o terreno montanhoso entre eles e o aeroporto.

Teriam que amerrisar. Eram 20h56’ hora local.

O motor #3, logo seguido pelo #2 e #1 foram também recuperados, mas prosseguir para o pouso em Jacarta era o óbvio, já que a continuação do vôo seria temerária sem uma avaliação do ocorrido.
O motor #2 começou a apresentar estol de compressor, e foi desligado.
Ao fazerem o procedimento de aproximação por precisão (full ILS), descobriram que a indicação de rampa (glide) não aparecia, e foi utilizado somente o indicador do eixo da pista (localizer), combinado com o DME. Apesar da visibilidade ser total, os parabrisas estavam cobertos quase que completamente de cinzas, e a visualização da pista só pode ser feita pela junção do vidro com a coluna central, que ficou relativamente transparente.
O pouso foi realizado normalmente, mas a falta de visibilidade impedia o taxi, e o avião teve que ser rebocado para o pátio.
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Não houve vítimas neste vôo, para decepção de alguns editores que deixaram de ter uma forte chamada para “vender” a notícia.

Tripulação do British Airways flight 09 após o pouso em Jacarta

Os motores ficaram completamente inutilizados, e os peritos que os examinaram entenderam que o reacendimento só foi possível porque o vidro criado pela fusão da sílica das cinzas no interior do motor, solidificou-se com a brusca diminuição de temperatura durante a descida, sendo quebrados e expelidos das aletas da turbina no processo de reacendimento.
Os tanques de combustível tiveram que ser descontaminados, porque entraram partículas pelos “surge tanks” (sistema de ventilação) e todo o sistema de pressurização também teve que ser reparado.

Este avião foi rebatizado pela tripulação de "Flying Ashtray" (cinzeiro voador) e entrou para o Guinnes Book of records, pela distância voada planando, e só foi superado em agosto de 2001 pelo A330 C-GITS  da Air Transat, que voou 65 NM sem motores, e pousou numa base aérea nos Açoures, por ter ficado sem combustível devido a um vazamento nos tanques.
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Conclusão: Uma tripulação bem treinada pode “solucionar” condições bastante desfavoráveis em vôo, e conseguir um resultado final sem vítimas e muita história para contar.
                               Pessoalmente.


Como o fez o Comandante Eric Moody na 2ª Conferência Internacional sobre Cinzas Vulcânicas e Segurança de Vôo, ocorrida em 2004 nos Estados Unidos da América do Norte.
Fontes:

quarta-feira, 8 de junho de 2011

REGIÃO DE COMANDOS REVERSOS


O vôo de baixa velocidade:

- Com o avião nivelado, para voarmos mais devagar, diminuímos um pouco a potência e aumentamos um pouco a atitude (nariz prá cima - cabrar), provocando:
  •  aumento do ângulo de ataque das asas;
  • aumento do coeficiente de sustentação proporcional à diminuição da velocidade, que manterá a sustentação igual ao peso do avião, permitindo o vôo nivelado;
  • aumento do arrasto induzido, compensado pelo motor (ainda);
  • diminuição do arrasto parasita, pela diminuição da velocidade.
E assim, nosso aprendiz de feiticeiro vai conseguindo voar cada vez mais devagar com sua nave, até que ela insiste em começar a perder altitude (descer), ao repetir este procedimento várias vezes.

- Bingo ! Acabou de achar a velocidade de espera, a “loiter speed”, ou seja, a velocidade de maior permanência no ar, que é bem próxima da velocidade de melhor planeio (usada nas emergências monomotor) e de melhor ângulo de subida ! É onde a potência disponível do seu motor é máxima – “sobra mais potência para subir”. 

Mas você quer voar mais devagar ainda, e resolve aplicar potência !

E seu avião fica estável na mesma altitude ! 

Ahá ! Superpilot ! Você acabou de entrar na região de comando reverso, onde mais potência é necessária para que você voe mais devagar. Você está dependurado no motor !

Veja na figura, a parte destacada, onde o coeficiente de sustentação começa a diminuir com o aumento do ângulo de ataque (antes do estol).

Nos aviões treinadores, a engenharia coloca uma série de artifícios para avisar o novato que o ângulo de ataque está muito grande: Torção ou variação do perfil do aerofólio para provocar “buffet” (trepidação), alarme de estol (buzina e luz), capacidade limitada do profundor em continuar cabrando o avião e até a presença angelical do instrutor de vôo.
Já nos aviões maiores, múltimotores de grande potência, essa região é aproveitada para se fazer a aproximação para pouso. O arrasto adicional é bem vindo, e a massa (peso) impede a desaceleração além do desejável.
Devido ao peso elevado desses aviões, qualquer diminuição de velocidade no toque significará muitos metros a menos de pista necessários para a parada, afinal, todos sabemos que a "quantidade de movimento" é massa vezes velocidade ! E haja freio !


Comente, caso esteja interessado em mais informações.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Upset recovery training - "Recuperação de atitudes anormais"

O foco são jatos voando em grandes altitudes.

Creio que entre nossos leitores temos poucos aviadores frequentadores assíduos de níveis de vôo maiores do que o 300.

Mas como "informação não pesa", acredito que você gostaria que eu me dispusesse a colocar um pouco de cultura aeronáutica à sua disposição:

Imagem inicial da apresentação da Flight Safety Foundation, encontrada em

O tema está em foco, porque o treinamento de recuperação de atitudes anormais com aeronaves de grande massa e inércia (pesadas) em grandes altitudes parece estar relacionado com o "crash" do vôo AF 447, conforme diversas matérias de sites oficiais, inclusive do BEA tem sugerido.
Por ora, vou indicar alguns sites sobre o assunto, que comentarei no próximo post.

Palestra em inglês, do: 

NBAA Upset Recovery Industry Update CASS 2011

 http://www.apstraining.com/2011/nbaa-upset-recovery-industry-update-cass-2011/

 

 Princípios aerodinâmicos envolvidos (site da Boeing Corp):

Aerodynamic Principles of Large-Airplane Upsets
http://www.boeing.com/commercial/aeromagazine/aero_03/textonly/fo01txt.html

Voltarei ao assunto brevemente.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

"Flight with unreliable airspeed"

Prá quem voa IFR - e para quem estudou teoria de vôo com a devida atenção, deve lembrar-se do axioma:

"ATITUDE é velocidade; POTÊNCIA é razão de subida ou descida."

Quem não entende isso, não entenderá o comentário como um todo.

No manual de vôo do 737 e 727, tínhamos um item de emergência denominado "Vôo sem indicações de velocidade" (tradução livre do título deste post).

Em caso de quebra do radome, ou falha do sistema anemobarométrico (pitots), mantenha a aeronave na atitude de nariz correspondente à velocidade desejada, e a potência dos motores de acordo...  A memória me trai para reproduzir os termos exatos, mas a idéia é essa.

Tenho informações "off the record" de casos semelhantes, que o aviador "voou atitude" até que os sistemas fossem restabelecidos. Mas não considere isso - atente apenas à lógica fria dos fatos.

O escopo do treinamento dos aviadores, PROPOSTO pelo fabricante da aeronave e APROVADO pela autoridade aeronáutica competente (quase coloquei entre aspas), deveria cobrir toda a gama de anormalidades e emergências possíveis de ocorrer com a aeronave. Se isso não ocorrer, o nome passsa a ser o adotado por quem trabalha com prevenção: FALHA LATENTE.

As autoridades francesas divulgaram a transcrição combinada do voice recorder com o flight data recorder, dos minutos finais do vôo AF 447: O aviador respondeu à indicação errônea do velocímetro, combinada com o alarme de estol com... pith up (nariz para cima) e lateralmente (espero que para nivelar as asas)...

Claro, não tenho todos os dados e nem quero "resolver" a investigação com este vislumbre vindo de uma transcrição da imprensa - Quem tem todos os dados e vai opinar em última e definitiva instância será o BEA - órgão francês de investigação de acidentes aeronáuticas.

Só quero dizer isso prá todos vocês:

"ATITUDE é velocidade; POTÊNCIA é razão de subida ou descida."
Jamais se esqueçam !


quinta-feira, 26 de maio de 2011

"SAFETY" e lucro


Safety é compatível com o lucro !

Só nas lendas, o almoço é sempre de graça.

Para que se tenha prevenção, é necessário investimento. Os recursos dos investimentos das empresas provém do faturamento maior que as despesas – o tão mal falado lucro nestes tempos de ideologia burra.

Causa-me espanto a “comemoração” de que o valor das passagens aéreas caiu 60% nos últimos anos. O que isso significa, seguindo a lógica fria dos números ?

  • ·         O preço do combustível NÃO baixou;
  • ·         O preços dos equipamentos (aeronaves e peças) NÃO baixou;
  • ·         Os encargos trabalhistas NÃO baixaram;
  • ·         As taxas de utilização da infraestrutura aeronáutica NÃO baixaram;
  • ·         O custo da construção civil, dos hotéis, taxis e demais serviços auxiliares NÃO baixou;

BAIXARAM:·          
  • Salários dos aeronautas/aeroviários;
  • Investimentos em treinamento (comissários de bordo, por exemplo, passaram a ser formados fora das empresas, por conta dos interessados);
E os gastos em promoção da Segurança Operacional, da prevenção de acidentes aeronáuticos, dos seminários especializados... Foram mantidos ?


quarta-feira, 25 de maio de 2011

AVIADOR ou piloto ?


Como fui questionado a respeito, esclareço a minha preferência declarada pelo uso do termo “aviador”,  ao invés de “piloto”, para referir-me aos privilegiados que operam máquinas voadoras.

Piloto necessita de adjetivação: piloto da canoa, piloto do Boeing, piloto da organização, piloto desta bagaça (vide CQC). Não vou entediá-los transcrevendo por aqui as definições do dicionário. Tem muitos disponíveis por aí.
AVIADOR é específico. Aviador relaciona-se a naves que voam: aviões, helicópteros, balões, planadores... É o homem da aviação – indiscutívelmente. 
Exemplo: 
Jamais entraremos em uma van para ouvir de um passageiro a frase: Esse aviador é bom ! Referindo-se ao motorista. 
Mas ...  “quem é o piloto que vai nos levar ?” é bastante comum, e confunde mentes a respeito do tipo de formação que um “piloto de aeronaves tem”.

Pilotando este meu teclado, com toda a força de meu espírito aviador, afirmo: 

Piloto é qualquer. Aviador, é único !

domingo, 22 de maio de 2011

Mercado de trabalho e Segurança de Vôo (Safety)


As empresas de aviação escolhem os aviadores mais qualificados disponíveis no mercado para compor seus quadros de piloto. Nas empresas de transporte aéreo regular (a “aviação comercial”), fazem a combinação entre pouca idade versus maior qualificação.

O que é “qualificação” ?

As licenças e habilitações técnicas são obrigatórias, e portanto não se enquadram no quesito de comparação de qualificações. Nivelam todos

Temos a quantidade total de horas voadas pelo candidato ao cockpit: Mais é melhor... mas nem sempre.
Duas mil horas de comando/instrutor de treinador primário (aeroboero, cessna 150/152/170 e outros monomotores leves), poderiam ser comparadas a 200 horas de aviões leves e 1800 de, digamos, copiloto de turbohélice bimotor (King Air, Carajá, Xingu), ou jato (Phenom, Lear, Citation Jet, etc) , estes últimos voando IFR, primáriamente ?

Depende, certo ? Se o posto é um comando de um monomotor, voando em aeródromos precários ou num cockpit de Boeing ou Airbus, uma ou outra tem suas vantagens.

Enquanto o selecionador for um aviador*, essa distinção certamente poderá ser feita de forma a colocar o homem certo no lugar certo. Caso seja uma setor de RH tradicional, essas sutilezas podem ser relevadas em favor da quantificação sobre a qualificação.

E o panorama atual, onde o emprego é farto, e raras as licenças e habilitações técnicas disponíveis ? 

Basta o mínimo ! E sempre que possível, aceitam-se boas promessas de aprendizado rápido e “bom mocismo”. Tudo dentro da mais estrita LEGALIDADE.

Recomendações de segurança: Formar maior quantidade de aviadores para suprir a demanda atual e futura ! 

Para isso, é necessário investimento e incentivos aos Aeroclubes e Escolas de Aviação,  por parte das autoridades, e não (jamais!) importar profissionais para ocupar os nossos postos de trabalho !

E isto está sendo feito ? 
                                                                                                              
* Certa vez fui fazer um concurso público organizado por uma "assessoria independente" renomada, que selecionava aviadores para uma empresa de economia mista. Solicitavam aviadores com marcas (horas de vôo e tipo de operação em helicópteros) expressivas. 
No dia da prova teórica inicial, apresentaram-se seis aviadores para a seleção, e todos se conheciam mutuamente. 
O auditório era imenso, e os recrutadores, na roda do cafezinho posterior à prova lançaram a dúvida: Porque tão poucos candidatos, e todos já empregados ? 
Resposta (óbvia só para quem é da aviação): Porque as qualificações que pediram só pode ser alcançadas por quem tem mais de 20 anos de aviação !